Como ser um estudante fracassado
Há alguns anos lecionando e tomando, inclusive, minha experiência
pessoal enquanto estudante, resolvo escrever esta pequena cartilha do estudante fracassado. São seis elementos práticos que
notei serem presentes na maioria dos estudantes que não possuem o primeiro dos
sucessos: o sucesso da aprendizagem.
1. Falte o máximo que puder.
Isso mesmo. Falte tanto quanto puder. Todo estudante fracassado é
aquele que não frequenta a rotina escolar. Não falo daqueles que são impedidos
por algum fator de força maior (como aqueles que estão afastados devido a doença ou a
algum problema familiar grave), falo daqueles que não querem mesmo ir à escola.
A lei garante para você a possibilidade de faltar a vinte e cinco por
cento (25%) das aulas oferecidas[1].
Geralmente temos duzentos (200) dias letivos. Deste modo, você que deseja ser
um estudante fracassado pode faltar cinquenta (50) dias no total, o que
corresponde a cerca de um bimestre inteiro. Aproveite. Saia, jogue bola,
assista seus filmes, fique na rua. Afinal, se a Lei Federal garante esse
direito, seja esperto. Para que levar seus estudos tão a sério assim?
Estudos comprovam que o aprendizado com um tutor presencial possibilita
o maior aproveitamento do aprendizado. Aliás, com o professor à disposição, as
dúvidas poderão ser sanadas, seus erros corrigidos e um direcionamento melhor e
eficaz a respeito de sua aprendizagem. É evidente que um estudante que deseja o
fracasso não vai querer ficar o tempo todo em sala de aula fazendo lição e
corrigindo suas tarefas, não é mesmo?
Ah, inclusive se por um acaso você se preocupar apenas com o seu número de faltas – e não com o seu aprendizado – o
CEE (Conselho Estadual de Educação) dá o direito aos estudantes paulistas de
realizarem um trabalho para a compensação de ausências. E isso é válido para que
todos os “alunos possam compensar as ausências que ultrapassem o limite de 20%
do total de aulas ao longo de cada mês letivo”[2]. Fique atento, quem define o controle de ausências e as suas compensações é
o Conselho de Escola. Mas fique de boa, afinal, você quer mesmo ser um
estudante fracassado.
2. Comemore as aulas vagas.
Professor faltou e os alunos serão dispensados? Oba! Comemore. Saia
gritando pelos corredores. Estampe seu sorriso e vá curtir seu tempo livre. “Mas
pera aí: Essa aula em que fui dispensado, eu vou ter reposição? ” Claro que não.
Você pagou por uma aula que nunca mais você vai ter na vida.
E se entrar professor eventual e não passar absolutamente nada de matéria nem de exercícios? Grite
de alegria. Afinal, o Estado de São Paulo gasta em média R$ 67 milhões[3]
por mês para colocar um profissional na tua sala e você aproveitar nada da aula
dele. Dinheiro oriundo de seus impostos. Mas você quer ser um estudante
fracassado, então pode pagar este valor todo para não aprender nada. E se o
professor eventual ousar ajudar no seu processo de aprendizagem, pense que essa
atividade não vale nota (sobre as notas falarei mais adiante).
3. Desorganize a sala.
Sabe aquele tempo de conversa em sala de aula que o professor fica brigando
com você para prestar atenção? Então, estudos apontam que o professor gasta
vinte por cento (20%) da aula mantendo a disciplina da classe[4].
Pense. Uma aula de cinquenta (50) minutos terá dez (10) minutos perdidos só com
o professor pedindo silêncio. Aliás, de aula mesmo, estudos apontam que apenas
sessenta e sete por cento (67%) do total da aula são aproveitados para o
processo de ensino e aprendizagem, algo em torno de trinta e três minutos e
três segundos (33m3s). Você tem a noção disso? Você paga por uma aula de 50 minutos e recebe apenas 33 minutos e 3 segundos. E se você estudar no noturno o tempo de aproveitamento das
aulas é bem menor. É como comprar uma pizza com oito pedaços e só receber cinco pedaços e meio. Dois pedaços e meio você paga, mas não recebe. Evidentemente que um estudante comprometido em ser um
fracassado nos estudos não se importará com o tempo perdido.
4. Fique com o celular sempre à mão.
Sabe os minutos em que a sala está em ordem e o professor explicando?
Pois bem, aproveite para ficar com seu celular na mão. Fale com amigos, mande
mensagens, ouça suas músicas, acesse as redes sociais. Se você se empenhar bem
e focar na tecnologia do seu celular e usufruí-la bem, certeza que o seu
rendimento em sala de aula será comprometido.
Uma universidade inglesa aponta que as escolas que retiraram os
telefones celulares durante o período de aula melhoraram catorze por cento
(14%) de rendimento escolar[5].
Então, para quê melhorar este catorze por cento? Melhor é ficar com o celular
na mão, o que te dá a garantia de fracasso nos estudos.
5. Seja um copista.
Você é daqueles que acham que copiar a lição da lousa é ser um bom
estudante? Isso é coisa do passado. A moda é ser simplesmente copista para ser
um estudante fracassado.
Há estudantes que colocam seu fone de ouvido e copiam aquilo que o
professor põe na lousa. Copiam tudo, indiscriminadamente. Não são capazes de
interpretar nada, apenas copiam. O importante é “ter a matéria no caderno”.
Aliás, sabe aquelas atividades de interpretação de texto, onde o
professor pede para que você escreva “com as suas palavras” aquilo que você
aprendeu? Nessa atividade o docente está te ensinando a interpretar os textos e
se apropriar do conteúdo. O “explique com as suas palavras” significa dizer que
você compreendeu plenamente o conteúdo de tal modo que você pode dizer que ele
também é seu. Não é mais Platão que diz, ou Pitágoras, ou Fernando Pessoa. Mas
é você que, ao se apropriar da teoria do autor se transforma em partícipe de
sua mensagem.
Para o estudante que deseja o fracasso fica uma dica: na resposta de
alguma questão, copie o trecho do texto inteiro. Aliás, digo mais, copie o
texto todo. Melhor ainda, copie o livro todo. Isso mesmo, pois assim o
professor não poderá ler tudo o que você copiou e poderá considerar sua
atividade como feita. E você terá garantido o aprendizado zero a respeito da
matéria.
6. Queira as notas, não o aprendizado.
“Professor, isso vale nota? ” Geralmente essa pergunta é feita
esperando-se um “visto no caderno”. Pouco importa se você aprendeu a matéria,
porque, o importante para o fracasso é ter nota, não aprendizado. Colecione
vistos no seu caderno, mas não procure saber nada sobre os assuntos. O fracasso
é garantido.
E nas provas e demais trabalhos? A cola te ajuda. Copiar a resposta do
“coleguinha do lado” te ajudará a nunca chegar ao saber. Pegue as respostas
prontas dos Cadernos do Aluno. Há vários blogs que te oferecerão a apostila
totalmente respondida. Só copie. E se não deu tempo de copiar, copie a resposta
do amigo do lado. Nas redações? Ah, o Google está aí para te dar textos perfeitos.
Copie-os todos! Só assim para ser um estudante fracassado. Não queria produzir nada de sua autoria.
Copie. Copie. Copie. No final de tudo, queira o boletim com notas que não correspondem
ao aprendizado. Sabe com o que você se parecerá? Com aquela pessoa que rouba o
cardápio de um restaurante. Ela terá apenas um papel com o nome da feijoada, mas não a
feijoada em si. O estudante fracassado quer isso: o cardápio e não a refeição.
Alguns estudantes querem algo além da nota. Querem o saber. Se no
cardápio diz “pizza de calabresa”, elas querem a pizza de calabresa de fato,
não apenas o cardápio impresso. Explicando-me. Os estudantes interessados
querem que, se no boletim vier escrito a nota oito, que, de fato, tenham o
aprendizado que corresponde a nota oito. Não querem apenas o número oito, mas o
conteúdo das matérias que corresponde a nota oito.
· Conclusão.
Você tem aqui uma pequena cartilha com seis passos para ser um
estudante fracassado. Seis por ser simbólico: na bíblia o seis significa o
inacabado, o imperfeito. É assim o estudante fracassado. Ele é imperfeito,
inacabado. Não deseja ser pleno, quer apenas o mínimo – e isso quando quer o
mínimo. A você, estudante que deseja ser comprometido com seu aprendizado, faça
tudo o que está aqui, mas de modo inverso. Assim você terá a certeza de
colaborar e de participar do seu processo de ensino e aprendizagem.
[1]
De acordo com a LDB – Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei
9.394/1996 – Artigo 24 - VI), do estudante é exigido a “frequência mínima de
setenta e cinco por cento do total de horas letivas para aprovação. Ver a lei
completa em http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/leis/L9394.htm
[2] Parecer
CEE 67/98 disponível em http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/notas/parcee67_98.htm
[3]
Falta de professor na rede estadual custa R$ 67 mi. Disponível em http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2013/04/05/falta-de-professor-na-rede-estadual-custa-r-67-mi.htm
[4]
Professor brasileiro gasta 20% do tempo de aula com indisciplina. Disponível em
http://educacao.uol.com.br/noticias/2014/06/25/professor-brasileiro-gasta-20-do-tempo-de-aula-com-indisciplina-segundo-estudo-da-ocde.htm
[5]
Pesquisa inglesa diz que uso de celular em sala de aula prejudica aluno.
Disponível em http://www.opovo.com.br/app/maisnoticias/tecnologia/2015/06/08/noticiastecnologia,3450228/pesquisa-inglesa-diz-que-uso-de-celular-em-sala-de-aula-prejudica-alun.shtml
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